8:30A noite

de Zeca Corrêa Leite

A noite conversa com o silêncio na imensidão de tudo
e vou escrever uma longa carta ao fantasma de mim.
Num canto da sala o realejo quebrado
faz companhia a um pássaro morto na solidão da gaiola.
A lua é prata clareando poetas vividos
e minhas mãos se cruzam e se cansam
à luz da vela moça no meio da vida em penumbra.
Eu amei muito as palavras e os poetas,
juntei um cesto de sonhos, sorrisos e fantasias
e levei-os até o universo espiritual de cada um
e foram abismos imensos e estranhos
que encontrei e que me marcaram.
Depois de tudo passado me voltam as lágrimas
como se eu fosse criança de vinte e três anos
a escrever uma poesia.
E um sorriso se quebra e escapa e voa
no espaço da madrugada
como os pássaros inocentes que gorjeavam esperança
em meu peito de poeta.
Mas a manhã me surgiu sem pássaros e sem sol
e então abri janelas e portas e a brisa entrou morta e fria
e me trouxe sons de vozes e passado que voltarão jamais
nas palmas das mãos de minha ternura.
As lembranças e a saudade fazem ciranda nas sombras
e as crianças sorriem inocência na brevidade de tudo.
Vou guardar seus brinquedos de felicidade
para que elas não os percam
pois é inevitável o dia da volta e do retorno
e a recordação é a sempre escora de uma dor.
Esqueço-me de tudo no cansaço da vida e dos anos.
Uma vela se queima morrendo no lume de sua chama
e minhas mãos trêmulas acariciam a pétala seca
da rosa envelhecida.
Não me lembro da saudade que sinto,
nem sei quais suas razões.
Faltam os rostos, as visões e os amores de outrora
e nem sei porque, mas lá fora, a madrugada brinca
em sonhos de amanhecer…

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