14:48Johnny Winter

Entrou como se fosse o mais frágil e doente dos velhinhos. Pele, osso, cabelos compridos, camiseta e calça jeans surradas. O corpo curvado parecia merecer uma bengala. O coluna em arco, levando a cabeça com o chapelão texano bem à frente, remetia a dores estomacais, para quem já sentiu algo tão dolorido quandto um punhal cravado na região. Uma cadeira o esperava. Uma cadeira e uma pequena guitarra. No primeiro acorde a imagem inicial foi varrida por tudo o que ele é e representa. Uma lenda viva do blues e do rock. Um dos maiores guitarristas de todos os tempos. Um monstro sagrado albino que, com os dedos longos e finos, faz o som varrer planícies, o lamento entrar na alma, os trovões incendiarem os tímpanos. Johnny Winter no palco do Guaíra, ontem à noite, foi como se materializasse o sonho daqueles que nunca puderam ver Jimi Hendrix e Steve Ray Vaughan, a quem ele reverenciou em acordes. Johnny Winter subindo e descendo o braço da outra guitarra, a tradicional, que empunhou ao fim do show, talvez porque ela pesa demais para seu mirrado corpo, pois ele subindo e descendo com o anel metálico e disparando faíscas com a mão direita, tinha a força de um Touro Sentado que sabe do poder emanado da sua palavra – e a palavra dele sai no som elétrico e na voz gutural, rascante e doce quando convém. Durante uma hora e meia ele dominou, sentado, olhar coberto pela aba do chapelão, para proteger-se da luz, todos que estavam ali no teatro para isso mesmo – reverenciá-lo. Até o fato de o som do microfone para sua voz estar baixo demais não incomodou como deveria. Ídolos são assim mesmo. E esse tinha um motivo a mais para ser consagrado ao final do show. Há pouco mais de dois anos suspendeu sua primeira turnê ao Brasil por causa da saúde. Agora veio. E mostrou que sua fragilidade é apenas do corpo e que isso não tem nada a ver com o mito.

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