6:00Encontro com o amigo

Ontem vi meu amigo. Na UTI de um hospital. Parecia dormir feito um anjo caído, recuperando lentamente as forças minadas por anos e anos da doença cuja dor era aplacada com o líquido que ajuda a matar quem o injere e, às vezes, inocentes que atravessam o caminho de quem o bebe e não pode. Um tubo levava ar para seus pulmões e, não sei por quê, fiquei olhando ali, nos breves minutos permitidos, a materialização do ar sagrado que nos mantém vivos e a quem não damos importância porque natural. Lembrei do meu pai. Talvez por ter recebido poucas horas antes mensagem emocionada de um filho que rememorava o dele, que partiu e ontem faria 98 anos. Talvez por ter passado os últimos dias dele ao seu lado, na cama de um hospital. Então, ao olhar meu amigo ali, me veio uma certeza dessas malucas, de esperança, de força que vem lá de não sei onde, enfim, veio a certeza de que, por ter passado por momentos parecidos, na tentativa do suicídio que é lento, e por ter sobrevivido, que eu poderia passar isso, a energia ou sei lá que coisa é essa sentida, para ele. Coloquei então a mão em sua cabeça, fiz o sinal da cruz e fui embora para aguardar nosso reencontro numa esquina desta existência.

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