7:31Na banca de revistas

por Thea Tavares

Sr. Gilberto é proprietário de uma banca de revistas perto da minha casa. Ele não só vende as publicações como está antenado diariamente com as novidades da política, do mundo artístico e com o noticiário policial. E gosta muito do que faz. Mas a leitura do obituário é para o Sr. Gilberto quase que uma religião e esse fato sempre desperta a crítica das moças que trabalham na revistaria. Porque, praticamente toda semana, ele se depara com um amigo ou conhecido nas notas de falecimento. “A fila anda!”, dizem as moças na tentativa vã de fazer com que o Sr. Gilberto largue o hábito da leitura, mas isso só alimenta ainda mais sua curiosidade. É como se ele tivesse desenvolvido um método estranho de contar sua própria posição nessa espécie de loteria do tempo, sob uma fórmula que ninguém compreende. A mulher do comerciante não se incomoda, porque, do modo dela, acredita que ele goze de uma saúde extraordinária: “Vaso ruim não quebra”.

Outro passatempo, que não deixa de ser parte do negócio, é ajudar as crianças a preencherem seus álbuns de figurinhas: de campeonatos de futebol, de celebridades, de princesas. O “tio” Gilberto também administra as trocas de figurinhas repetidas entre os colecionadores e, com esses dois ofícios cotidianos, um vício compensa o outro. Assim, a vida de todos nós segue em frente, confiante de que o inevitável é também imprevisível. O máximo que se pode fazer é dar significado a cada instante, deixando a marca dessa história registrada pelo caminho que vai sendo percorrido.

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