14:50Ao ciclista desconhecido

por Jorge Eduardo

Recorro a este blog porque, se você não o lê, alguém que você conhece deve ler e lhe transmitirá esta epístola. Também está no meu blog (http://blaguedoblog.blogspot.com), mas este só eu leio.
Pois é, companheiro. Fui eu que hoje (sexta), por negligência, por confiar na buzina e, instintivamente, pensar que seu instinto supera a razão, acabei por derrubá-lo de sua briosa bicicleta quando eu buscava entrar na garagem do prédio onde moro.
Escrevo esta para, sonoramente e em público, pedir-lhe desculpas.
Fui negligente, sim, e principalmente arrogante por achar – e não é o que realmente penso – que uma buzinada seria o bastante para que você diminuísse a velocidade a me deixasse passar.
Deixar por quê? Você trafegava à direita da pista, bem junto à guia, respeitoso com as regras do trânsito. Deve ter acreditado que eu, civilizadamente, frearia meu possante 1.0 e esperaria você passar para, em seguida, eu entrar na garagem.
Paguei o preço do que me livro todos os dias nessa Itupava que agora virou via rápida. Quando me aproximo de casa, dou sinal com a seta, coloco o braço pra fora e faço aqueles gestos de lei que ninguém mais usa e, ainda assim, ouço freadas e, vez ou outra, um filhodaputa pela orelha esquerda. Hoje tinha um carro colado atrás do meu e achei que dava tempo de te ultrapassar e encostar na entrada do prédio.
Errei, e errei feio, e é por isso que peço desculpas.
Isso não me absolve, por certo. Cometi uma infração de trânsito por agir com negligência e não respeitar o ciclista.
Mas, como aconteceu de eu subir para ligar para o corretor de seguros e você partir sob aplausos da multidão, resta-me falar com você por meio do glorioso Blog do Zé Beto.
Você e sua baique saíram ilesos da minha barbeiragem. Eu, logo que constatada minha culpa (tanto que subi e liguei para o corretor de seguros), faria questão de te indenizar, se dano houvesse. Como tudo não passou de um baita aborrecimento, principalmente para você, obviamente, restar-me-ia a vergonha do erro cometido em público e um contrito pedido de desculpas.
É o que faço agora, no meio da praça, para purgar o mal que lhe causei.
Mas entenda algumas coisas:
1 – Eu não estava a 190 km por hora, embriagado, apostando racha com um bacana ainda não-identificado;
2 – Aconteceu um lamentável, mas superável acidente de trânsito, felizmente sem ferimentos físicos e sem danos materiais;
3 – Você não precisava tentar me dar lição de moral e de cidadania em público, como se estivesse diante de um débil mental;
4 – Você não precisava bradar que queria ver o mesmo acontecendo com meu filho;
5 – Você, enfim, não precisava dar aquele show, bancando a vítima de um motorista insano, um cretino que não respeita o ciclista;
6 – Você, ciclista desconhecido, comportou-se como um motoboy, e até agora, preocupado, espero manifestação de ciclistas diante do meu prédio, chamando-me de assassino, bradando “nóis qué justiça” e coisa e tal;
7 – Você não é dono da verdade e bicicleta é veículo, portanto sujeita a acidentes – por certo, sempre lamentáveis.
De minha parte, quero lhe assegurar que, de agora em diante, redobrarei meus cuidados e frearei meu possante para deixar o ciclista passar (quando voltar a dirigir). É assim, na verdade, que me comporto no dia-a-dia- do trânsito.
Hoje, infelizmente, errei, pelo que me penitencio.
Ao final e afinal, peço-lhe desculpas mais uma vez, dou-lhe os parabéns pelo show e prometo ser um bom menino daqui por diante.
Se você for, por um acaso do destino, o ciclista filho do Jacques Brã, campeão mundial de ciclismo de rua e defensor das baiques, pergunte-lhe sobre mim e ele lhe dirá que eu, apesar de tudo, sou um bom sujeito.
Traumatizado pelo acidente e pela bronca, fui trabalhar a pé esta tarde e pretendo voltar a ser pedestre daqui por diante. Melhor assim.
E ai de você, ciclista desconhecido, se subir na calçada onde eu caminho ou, se eu estiver deitado na rua, me mandar sair da frente.
Aí serei eu o certo e você não escapará dos meus sopapos.
Boa sorte a você e aos demais ciclistas curitibanos.
Assinado: Jorjão, agora e de novo o pedestre-dono-de-todas-as-verdades, um ser superior aos motoristas, aos motociclistas e até aos ciclistas.

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