8:30Dona Zefa

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No jardim da dona Zefa – Foto de Ricardo Silva

Me chamava de Beto e foi assim, pronunciando o nome como se estivesse perguntando e afirmando ao mesmo tempo, que atendeu ao telefonema naquela tarde de segunda-feira. Eu aqui, ela lá, no hospital, a milhares de quilômetros. Tinha saído da UTI, eu fazia planos de levá-la para o grande passeio que nunca fizemos pelo litoral das Alagoas. Me disse adeus. E foi para sempre. Porque no início da madrugada do dia seguinte ela se foi, há sete anos. Deixou de presente nossas vidas, a dos dois filhos, dos quatro netos e da bisneta que não conheceu. Deixou o jardim mágico onde Ricardo, que chamava de Rico, descobriu-se fotógrafo e nos presenteia quase diariamente. Deixou-me o o pouco de dom da palavra que tenho, mesmo sabendo apenas o básico da escrita. Mas falava, “até com a torneira”, como dizia seu companheiro, meu pai, Zé Luis, a quem tratava de “Filhinho”. Tinha o rosto que parecia triste, porque quase sempre séria e acentuado pelo traço da boca caído nos cantos, coisa que herdei. Mas era o humor em pessoa, observadora mais que arguta, e rápida nas tiradas venenosas como uma repentista das mais afiadas. Praticou a vida toda o “amor-doação”, que por acaso hoje li numa folhinha do Sheicho-No-Iê. Senti toda a dimensão disso na hora em que cheguei à sala lá de casa, em Palmeira dos Índios, pouco antes do enterro naquele cemitério que é perfeito para ela, pois simples, perto do sítio onde nasceu, em meio a plantações, um pouco de mata e de onde dá para ver o morro do Cristo, que toma conta encravada no sopé e de todo o resto daquele mundo de Deus. Josefa Maria da Silva, dona Zefa, Zefinha, o grande amor da minha vida que me faz chorar de saudade e alegria por ser seu filho. É a ela quem recorro quando tudo me parece fugir do controle. Olho a foto em preto e banco que sempre está aqui na minha frente. Ela, à frente dos meus três filhos sorri como eles – de alegria de viver. Para sempre.

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