por Zé da Silva
Libra
As Ferraris ele viu um dia numa revista no consultório do dentista. Revista velha, porque o dentista também era velho e não renovava o estoque das publicações. Ficou hipnotizado. Nunca tinha se ligado em carros, mas ali toda uma coleção estava exposta ao tempo num enorme salão de um castelo abandonado. Leu. Problemas judiciais embargaram todos os bens do nobre de bom gosto. A poeira e musgos cobriam quase tudo. Era num país da Europa. Ele se encantou e foi atrás. Com o que tinha e o que não tinha. Dois anos depois conseguiu chegar lá. Não havia guardas, não havia nada. E as máquinas, todas vermelhas, continuavam do mesmo jeito. Olhou, olhou, olhou. Descobriu que as chaves estavam na ignição. Não sabe por que. Entrou no primeiro modelo, Dino. Girou. Não pegou. Mas havia uma bateria reserva naquela garagem maior do que muita mansão. Fez a conexão. Ouviu o ronco. E assim fez com todas as máquinas. Talvez esteja fazendo até hoje. Nunca mais saiu dalí. Mentira. Apenas para comer frutas da época. Seu prazer é ouvir o ronco. Aquele ronco. Nunca andou um milímetro. Porque nunca soube dirigir.