por Zé da Silva
Escorpião
Aceitou ser candidato porque a mãe lhe pediu. Vá ajudar o povo, você é honesto e muito querido por todos. Ele foi. A cidade era pequena. Escolheu um partido. O que achava justo. Foi eleito. Comprou um terno para pagar em 12 vezes. Foi ao trabalho. Lhe ofereceram de tudo. O plenário parecia banca de camelô. Dinheiro do transporte. Dinheiro do lixo. Dinheiro das empreiteiras. Dinheiro para ficar quieto. Dinheiro para ficar doente. Dinheiro. Não dormia mais. Ele e a família receberam telefonemas com ameaça de morte. Justo na cidade onde nunca houve um assassinato. Ficou apavorado. Foi conversar com o padre. Este fechou a portinha do confessionário. Tinha medo também. Renunciou ao mandato. Teve de fugir da cidade. O povo que lhe confiou os votos se achou traído. Se enfiou no meio da selva. Num vilarejo. Não fala com ninguém. Não assiste televisão. É uma espécie de faz tudo no local. Conserta fogão, geladeira, encanamento, trabalha por empreitada na roça dos outros. Sobrevive. Lhe apelidaram de mudinho. Ele apenas ri quando o chamam.
Conheço um assim, de verdade. Ele existe.
é bem a cara da ‘política’ fazer isso com as pessoas. primeiro atrai depois estraga. no caso do mudinho a ‘selva’ foi o escape.