13:51Bem no Sul, ruim no País

Os economistas Cid Cordeiro Silva, supervisor regional do Dieese, e Fabiano Camargo, e o engenheiro Valter Fanini, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná (Senge-PR) apresentam amanhã o resultado de um estudo que chegou à conclusão que “os estados do Sul e do Sudeste do País investem proporcionalmente menos que os estados de regiões menos desenvolvidas”. Descobriram também que, se não faz feio nas regiões Sul e Sudeste, o Paraná também não tem de que se orgulhar. “É preocupante observar que, em quase todos os indicadores analisados, o investimento público do Paraná piorou entre 2000 e 2007. A exceção é o investimento per capita”, afirma Camargo. O Estado está na primeira colocação entre os estados do Sul e Sudeste em investimentos sobre receitas e sobre gastos públicos. Mas na comparação com todos os estados do País, o desempenho paranaense é pífio — a melhor colocação é um 14.º lugar, em 2003, em investimentos per capita. Não raro, o Paraná figura entre os dez estados com pior resultado. Segue um resumo de todo o estudo:O BAIXO NÍVEL DE INVESTIMENTOS PÚBLICOS

NO BRASIL E NO PARANÁ 
 

O baixo nível de investimentos públicos no Brasil

O Brasil apresenta, nas últimas décadas, baixas taxas de crescimento econômico. Pior — durante quase 25 anos, a economia brasileira ficou praticamente estagnada. Um dos principais fatores desse limitado crescimento são os baixos níveis de investimento público. Para termos a dimensão da importância que a atuação ativa do estado tem sobre a economia brasileira, basta observamos as taxas de crescimento econômico médio do PIB brasileiro medidas pelo Banco Central durante as décadas de 1960 — quando contávamos com fartas políticas públicas de investimentos — e 1990 — auge do neoliberalismo brasileiro. Vejamos: 1961/70: 6,17%; 1971/80: 8,63%; 1981/90: 1,57%, 1991/2000: 2,64%. Assim, é possível verificar a importância da atuação estatal no ambiente econômico nacional.

O Brasil foi um países que destinaram elevados recursos públicos para investimentos. O Estado promoveu no período 1930-1980 — principalmente da década de 50 até o final dos anos 70 — políticas de incentivos ao investimento, e fundamentalmente atuou diretamente na realização de investimentos. Nessa fase de desenvolvimento da economia brasileira, o Estado participou ativamente do processo econômico, implementado medidas como o Plano de Metas (1956-1961) e o II Plano Nacional de Desenvolvimento (1974-1979). Os investimentos estatais influíram fortemente no crescimento do País no período. Coincidentemente, como se verifica acima, nesses anos o Brasil apresentou as maiores taxas de crescimento econômico de sua história, inclusive com o chamado “milagre econômico” brasileiro (1968-1973), quando o Produto Interno Bruto (PIB) apresentou crescimento médio anual de 11%. 
 

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O Plano de Metas implementado pelo governo JK ficou conhecido pelo mote “ 50 anos em 5”. O Plano Trienal foi implementado em 1963, com a previsão de se encerrar em 1965. Porém, com o golpe militar em 1964, foi abruptamente abortado. Durante a ditadura militar, foram implementados cinco planos econômicos, que tiveram como aspecto negativo o aumento da concentração da renda e da riqueza no País. Neste período, foi criada a expressão conhecida como a “teoria do bolo”, na qual seria necessário aumentar a riqueza nacional para posteriormente distribuí-la na sociedade.

Acontecimentos da segunda metade da década de 1970, como as crises do petróleo e o endividamento brasileiro, bem como a influência da doutrina neoliberal, que preconizava o estado mínimo, fizeram com que os investimentos públicos ficassem relegados a segundo plano do início da década de 80 até o começo do século 21. Este período de pouco mais de duas décadas (1980-2002) foi extremamente deletério para a sociedade brasileira.

A década de 1980 ficou conhecida pela alcunha de “década perdida”, em referência à estagnação econômica, baixas taxas de crescimento econômico, aumento do desemprego, redução dos níveis salariais, “explosão” dos índices inflacionários e endividamento do Estado brasileiro.

Na década de 1990, as políticas neoliberais e a doutrina do “estado mínimo” continuaram a dominar a condução da economia, com a promoção da abertura econômica, a reestruturação produtiva e as privatizações entrando na agenda dos governos. As taxas de desemprego “explodem”, e a renda dos trabalhadores cai. Neste cenário totalmente desfavorável, crescem as atividades informais e ocorre a precarização das condições de trabalho.

A partir de 2003, percebe-se uma alteração no cenário dos investimentos públicos no País. A implementação de medidas como o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), em 2007, tem influído para restaurar o poder de atuação do Estado como promotor e indutor do crescimento econômico, com investimentos estratégicos na infraestrutura econômica e social. Assim, espera-se que políticas públicas ativas, como a de investimentos, sejam capazes de promover a inclusão social e a geração de empregos e, desta forma, contribuir para a distribuição da renda e da riqueza no Brasil. No entanto, o modelo econômico, ainda centrado em elevadas taxas de juros para controle da inflação, tem forte influência negativa sobre a dívida pública e o crédito, dificultando o investimento público e desestimulando o investimento privado. 

A situação brasileira é preocupante. Como uma nação considerada utopicamente o “país do futuro” poderá se desenvolver e enriquecer se não houver ação estatal ativa, com vistas a fomentar o investimento público? Sem investimentos, como se criarão novas vagas para as mais variadas classes de trabalhadores, dentre as quais os engenheiros, cujo mercado de trabalho está diretamente relacionado a realização de obras públicas de grande porte (rodovias, portos e aeroportos, por exemplo)? 

Entre 2000 e 2007, a média de investimentos públicos sobre o PIB no Brasil ficou em 1,70%. O maior percentual obtido pelo País foi de 2,34%, em 2001. A média de investimentos sobre o PIB de 28 países emergentes analisados é de 5,90%. Para termos uma dimensão exata destes baixos níveis de investimentos, faremos na seqüência uma comparação entre os níveis brasileiros e os de outros países em desenvolvimento. Esta comparação de percentuais de investimentos sobre o PIB nos mostrará a falta de políticas ativas de fomento ao investimento público no Brasil. Deixará claro, ainda, como o País esta perdendo oportunidades de implementar um modelo de desenvolvimento econômico sustentado pautado na ação pública, com ênfase nos investimentos públicos.
 

E quanto estão investindo os países em desenvolvimento?

Não é  possível imaginar o crescimento e desenvolvimento econômico de uma região sem investimentos elevados em infraestrutura — postos de saúde, escolas, estradas etc. O Brasil foi um bom exemplo da forte intervenção estatal na economia durante parte do século 20. No período, os investimentos feitos diretamente pelo Estado ou empresas estatais eram formas de conduzir o País ao crescimento econômico. Diversos planos foram implementados a partir dessa ideia, com destaque para o Plano de Metas e o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND).

Atualmente, devemos observar com atenção o exemplo dado pelos países asiáticos, em especial a China, que destina importante parcela do seu PIB aos investimentos públicos, tornando-se assim uma nação competitiva e que com isso busca promover melhores condições de vida para a sua população. Para termos uma idéia da disparidade entre a realidade brasileira e a da China, basta compararmos o nível de investimentos públicos sobre o PIB. Enquanto a China apresentou percentual médio de quase 20% (19,54%), de 2000 a 2007, a média de investimentos sobre o PIB do Brasil foi de 1,70%. Em uma amostra com 28 países emergentes sobre o percentual de investimentos sobre o PIB no período de 2000 a 2007 ficamos na penúltima colocação, à frente apenas do modesto Turcomenistão. Em 2003, o Brasil ficou na última colocação.

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O quadro piora quando o Brasil está inserido em uma amostra de 135 países emergentes. Também neste universo, permanecemos na penúltima colocação (não conseguimos avançar nenhuma colocação), novamente à frente apenas do Turcomenistão. Na primeira amostra, a média fica em 5,90%, na segunda amostra a média entre 2000 e 2007 se eleva passando para 7,22%. Mais detalhes em http://www.joserobertoafonso.ecn.br/site/aspx/AcervoPessoal.aspx?Tip=2&Num=%20415.

Constatamos, dessa forma, a disparidade entre os níveis de investimentos públicos sobre o PIB no Brasil e demais países em desenvolvimento. Como poderá  haver crescimento e desenvolvimento econômico sustentados se um dos principais entraves — o baixo nível de investimentos públicos —não for solucionado? Como o País poderá se consolidar como uma economia desenvolvida e competitiva se não dispuser de uma infraestrutura econômica e social adequada?
 

E como ficam os trabalhadores?

Uma das categorias de trabalhadores que mais sofreram — e ainda sofrem —  com os efeitos da falta de investimentos públicos no Brasil é  a dos engenheiros. Durante as décadas de 1950 e 70, o Estado teve importante papel no desenvolvimento do País. Vislumbrava-se, então, a importância da realização de grandes obras estruturais. Em consequência disso, geravam-se empregos para uma gama de trabalhadores brasileiros. A criação de empregos possui elevado efeito multiplicador, aumenta a massa salarial dos trabalhadores, impulsiona o consumo, provocando o aumento da produção das indústrias. Com isso, cria-se um ciclo virtuoso para o crescimento econômico.

Porém, do início da década de 1980 até incio do século 21, os empregos para os engenheiros rarearam. Neste período, a visão do Estado era imediatista, de curto prazo. Deixou de existir o Estado atuante, planejador, interventor, que buscava o desenvolvimento nacional. As políticas públicas com o intuito de promover o crescimento econômico foram relegadas a segundo plano. Prevaleceu a visão neoliberal, da desregulamentação, do estado mínimo, na qual o mercado seria o agente “ideal” para melhor alocar os recursos econômicos. Mas, como é de conhecimento geral  isto não deu certo — basta olhar o desempenho econômico brasileiro nas décadas de 1980 e 90.
 

O papel do PAC

Em 2007, foi lançado o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que sinalizou a retomada de uma ação governamental planejada com vistas a devolver ao Estado a capacidade de orientar o crescimento econômico do País, pelo incremento da taxa de investimentos públicos e privados em áreas consideradas estratégicas como energia e infra-estrutura. Mesmo não tendo a complexidade dos planos econômicos implementados no século 20, espera-se que o PAC consolide ao menos a visão do planejamento de longo prazo, da construção de uma nação desenvolvida que possa prover todos os seus cidadãos com condições sociais e econômicas para uma vida digna com a geração de postos de trabalhos remunerados de forma adequada.

Em seu lançamento, o PAC previa recursos da ordem de R$ 503,9 bilhões até 2010. Posteriormente, a inclusão de novas ações elevou os recursos para R$ 646 bilhões. Além disso, foram adicionados mais R$ 502,2 bilhões para investimentos após 2010, chegando-se assim ao montante de R$ 1,14 trilhão.
 

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E o nível de investimentos públicos no Paraná?

Infelizmente, vê-se que esta falta de “preocupação” com uma política definida de investimentos públicos não se restringe a esfera do governo federal. Esta característica também faz parte da realidade dos estados brasileiros. É preocupante observar que, em todos os indicadores de investimento analisados (exceto investimento per capita), a situação do estados, ao invés de melhorar, piorou entre 2000 e 2007. A mesma tendência se observa na média nacional de investimentos públicos. Desta forma, há a necessidade de tornar novamente os investimentos públicos o ponto elementar da ação dos governos em todas as esferas.

Os estado que conseguiram obter as melhores médias de investimentos públicos sobre o PIB foram Tocantins e Acre, com percentuais de 8,97% e 7,29% respectivamente, no período de 2001 a 2007, acima, portanto, da média de investimentos dos 135 países da nossa amostra. Ainda assim, as médias de ambos os estados estão distantes das apresentadas pelos líderes na classificação. Nossos estados investiram uma média de 0,84% do PIB entre 2001 e 2007.

No Paraná, vemos uma situação ainda mais preocupante. Além de estar abaixo da média de investimentos dos estados brasileiros, o Paraná fica abaixo da média de investimentos feitos pelo governo federal (penúltimo colocado entre os países em desenvolvimento). E mais — há uma distância enorme entre a média dos investimentos dos 135 países e a do Paraná, para não falar na discrepância com os percentuais de investimentos dos países líderes da classificação. Parece que a tão propalada política de investimentos públicos do Estado do Paraná não se sustenta quando analisamos os dados de investimentos empenhados contabilizados pela Secretaria do Tesouro Nacional.

A média de investimentos apresentada pelo Paraná entre 2001 e 2007 ficou em 0,77% do PIB. O melhor percentual obtido pelo Estado foi de 1,03% em 2002. Naquele ano, porém, a média de investimentos dos estados brasileiros alcançou 1,05%. Num período de sete anos, em cinco anos a média de investimentos paranaenses ficou abaixo da média nacional. 

O Paraná  possui o 5.° maior PIB e a 6.ª maior população entre os estados brasileiros. É considerado uma das principais potenciais nacionais, e a complexidade de sua economia contribui positivamente para a arrecadação de impostos e tributos. Era de se esperar que tal arrecadação fosse destinada em igual proporção para os investimentos. Não é o que se verifica. Quando mensuramos os indicadores de investimentos, vemos que o Paraná estará sempre em posição intermediária ou entre os dez últimos colocados no período entre 2000 e 2007 — muito abaixo do seu potencial, portanto. 

Na tabela abaixo, verificaremos a posição do Paraná nos indicadores de investimentos entre 2000 e 2007 analisados neste trabalho. A situação vivida pelo estado é preocupante — a melhor colocação obtida ocorreu no ano de 2003, com a 14.° posição em investimentos per capita.

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Como pode o estado contribuir para o crescimento e desenvolvimento econômico se não atua de forma ativa, promovendo investimentos? Estamos muito distantes da realidade desejada.

Um dos fatores que prejudica a política de investimentos do Paraná, dos demais estados brasileiros e do governo federal são os elevados encargos financeiros. Entre 2000 e 2007, o Paraná destinou R$ 13,498 bilhões para encargos da dívida, mas aplicou apenas R$ 8,426 bilhões em investimentos. Ou seja — para cada R$ 0,62 investido, R$ 1 foi para pagamento dos serviços da dívida. Do período analisado, 2006 foi o ano em que o Paraná destinou o maior volume de recursos para a realização de investimentos públicos. Veja mais detalhes na tabela abaixo.

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Considerações Finais

Durante mais de 20 anos, entre a década de 1980 e o início dos anos 2000, os investimentos públicos ficaram em segundo plano, em decorrência dos ideários da doutrina neoliberal, que preconizava que o mercado, por si só, seria capaz de promover o pleno emprego na economia. Isso, como sabemos, nunca aconteceu. Ao contrário — esse modelo levou à grande crise financeira internacional de 2008, iniciada no mercado imobiliário norte-americano. Neste momento, surge a oportunidade para os formuladores de políticas econômicas recolocarem o estado como agente protagonista da promoção do crescimento e desenvolvimento econômico. 

Assim, é  certo que somente com mais investimentos em infraestrutura econômica e social, mais atuação do estado e o reaparelhamento da máquina pública que se poderá gerar mais empregos, elevar a renda e influir na melhoria das condições de vida da população paranaense.

Como um País poderá promover o desenvolvimento econômico sustentado se destina um percentual muito reduzido dos seu PIB para investimentos públicos? Lembremos — a média brasileira entre 2000 a 2007 é de 1,7%. No ranking dos investimentos, o Brasil conseguiu ficar a frente apenas do Turcomenistão — em 2003, nem isso, fomos os últimos colocados entre 28 países em desenvolvimento. No mesmo período, a média mundial foi de 5,90%.

Também  é preocupante observar que, em todos os indicadores analisados (exceto investimento per capita), a situação do Paraná, em vez de melhorar, piorou entre 2000 e 2007. A mesma tendência se observa na média nacional de investimentos públicos dos estados. 

Para alcançar o sonhado desenvolvimento econômico sustentável, os entes públicos poderiam tomar como referência os investimentos públicos realizados pelo Brasil durante as décadas de 1950, 60 e 70. Tais investimentos foram um dos elementos responsáveis pela promoção do crescimento econômico do período. Se quisermos ser mais ousados, poderíamos tomar como parâmetro os montantes de investimentos realizados nos últimos anos por China, Malásia e Índia, por exemplo, que explicam as expressivas taxas de crescimento observadas nestes países. 

Os investimentos tem de fazer parte da agenda dos governantes para que se tornem efetivos, contínuos, e não somente esporádicos. A decisão de realizar investimentos deve estar pautada na busca por melhores condições sociais e econômicas da população, para que possamos ter empregos e renda, fomentando assim o crescimento e o desenvolvimento da sociedade. A elaboração de políticas públicas de investimentos deve ter como base o que é feito atualmente e o que deixou de ser feito no Brasil neste segmento. Só assim será possível planejar e implementar um Estado atuante e programar o nível de investimentos necessário.

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2 ideias sobre “Bem no Sul, ruim no País

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