19:00Horóscopo

por Osman Gadoso

Libra

Nem sabia mais como era trafegar na zona cinza, no limbo, no purgatório que via nas figuras do catecismo do colégio de freiras. Acordou dentro dele. Parecia que tinham colocado uma âncora no coração e uma adaga atravessada na garganta. O sol brilhava mas não sentia o sol. Alguém cantava uma música que respirava otimismo e ele só conseguia pensar em como as pessoas eram idiotas a tal ponto. A diferença de agora para alguns anos antes era a ausência do pirilipimpim e da água que passarinho não bebe. Nelas se atolou até sentir o bafo do demônio e ouvir a maldição dos homens – e só queria não sofrer a dor da existência. Mas isso foi há muito tempo e o normal tinha se tornado a sua loucura diária. Até que acordou daquele jeito. Do nada. Aí foi acender a vela no altar dos que já foram. Um vento que atravessou a copa de uma araucária tinha apagado a chama. Ritualmente, fechou a janela, olhou os sorrisos estampados nas fotografias e riscou o fósforo. Levou o fogo bem em câmera lenta até o contato com o pavio. Nunca tinha reparado neste momento. A ligação instantânea que eterniza o brilho. Que ilumina a noite. O breu. O cinza. Foi dormir então com a esperança de acordar de novo como veio ao mundo. Só com o pecado original.

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