9:36Horóscopo

por Osman Gadoso

Áries

Todo dia ela desce a escadaria íngreme no ritmo que os seus noventa anos permite. Ancorada por uma bengala atravessa o imenso jardim e sempre olha para as copas das árvores que um dia plantou junto com seu grande amor, que já se foi há muito tempo. O vestido sempre é estampado. Quando está frio, coloca um casacão de lã azul, que resiste ao tempo como ela. Gosta de andar de chinelo, por isso, num dia como o de hoje, coloca meias – sempre de uma cor forte, como o amarelo preferido. A não ser quando chove, vai para a calçada pouco depois das sete horas. O tráfego a essa hora já é intenso, mas parece que não existe para ela. Porque concentrada na sua primeira grande tarefa do dia: varrer e juntar as folhas das enormes árvores que estão ali como guardiãs de seu canto no mundo. Para fazer isso ela pendura a bengala no braço esquerdo e varre com a paciência de um monge. Encosta tudo no pé de uma das árvores e se o vento tira algumas folhas do monte, vai lá e varre de novo. Um dia por semana atravessa a rua para ficar na porta da agência bancária que ali existe. Sozinha. Sempre. O trânsito pára. Carrega folhetos da sua igreja. Distribui para quem entra ou sai do banco. Depois volta, entra pelo portão de ferro pintado em azul e some no seu pequeno paraíso. No dia seguinte, lá está ela, na calçada, varrendo, cuidando e admirando do que plantou. A vida é isso.

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