Artigo do ex-governador Jaime Lerner no Terra Magazine (www.terramagazine.com.br):
5,6 trilhões de dólares é o total de recursos já empenhados pelo governo dos Estados Unidos em medidas que têm como objetivo superar a crise financeira.
O mundo assiste aos anúncios sucessivos de socorro financeiro por parte dos governos, a bancos, montadoras, agências de crédito, real state. A explicação tem sido a necessidade premente da garantia de empregos.
Isto é, vamos continuar jogando recursos num sistema financeiro que não soube se controlar, atingindo o caos da irresponsabilidade.
Alguns economistas acham que a saída seria aumentar gastos públicos, desde que não seja de forma permanente.
A ironia é que tempos atrás, o setor privado é que cobrava dos governos a responsabilidade fiscal, conseguida em parte a custa de cortes de investimentos sociais, adiando avanços de qualidade de vida tão necessários.
O grave nisso é que essas injeções de recursos ocorrem de maneira abstrata, sem gente. Claro que o objetivo é a garantia de empregos, mas esses empregos não significam que as pessoas sejam beneficiadas.
Se o argumento básico é a manutenção de empregos, que tal uma injeção de qualidade de vida. Não se pode esquecer que investimentos em qualidade de vida geram mais empregos.
Vamos direcionar a agulha da injeção para um novo paradigma. Melhorar a oferta de habitação, transporte coletivo e saneamento em todos os países. Já imaginaram toda essa dinheirama redirigida para gente?
5,6 trilhões de dólares (só os Estados Unidos) mais o que os demais países estão bancando dariam para melhorar as condições para a África sair da miséria. Basta direcionar os recursos para habitação, saúde, educação, transporte público e saneamento. As palavras crédito e infra-estrutura são muito genéricas para que se assegure que realmente os recursos financiarão as necessidades de casa, água e esgoto, transporte público. E olhe que parte desses recursos tem retorno. Não é o crédito (para os bancos), é a qualidade de vida para gente. Esses recursos devem ser carimbados para as pessoas. O dólar com cara de multidão, de gente, oportunidade de um ‘new deal’ mundial.
O grande desastre sempre foi a separação das atividades econômicas dos assentamentos humanos. Tratar a economia separada das pessoas. E os experts explicando a tragédia, ou prevendo o quanto ela vai nos atingir.
Se projetarmos a tragédia, vamos encontrar a tragédia. É essa a tendência dessa ciência post-facto que não acerta nunca porque joga contra as pessoas. Sempre com a chave na mão, sem encontrar a fechadura.
Aí está uma manifestação que tem a competencia de dizer em poucas palavras, com clareza e simplicidade que todos entendem, uma verdade fundamental: o dinheiro só tem significado se dirigido para gente – habitação, saúde, educação, transporte público e saneamento, como enumera Lerner. É o que elas precisam como substrato para suas vidas. O resto elas fazem. Disse Victor Hugo: “Não há nada tão forte quanto uma idéia cuja hora é chegada.” Tomara !